Após uma gestão turbulenta de dois anos no Ministério da Cultura, entre setembro de 2012 e novembro do ano passado, Marta Suplicy passou, à contragosto, suas funções para o ex-ministro Juca Ferreira que reassumiu o cargo no dia 1º de janeiro. Marta estava no ministério desde a saída de Ana de Hollanda, muito criticada em sua gestão por ter recuado na questão de flexibilização de direitos autorais e no incentivo de artistas independentes, bandeiras que foram defendidas por Juca entre 2008 e 2010 e até pelo antecessor Gilberto Gil – embora o cantor tenha se focado mais na disseminação do software livre. Para tentar diferenciar as gestões de Marta e Juca, o site Geração Gamer faz uma avaliação de como os ministros contribuíram para a cena de games no Brasil. O intuito do texto é tentar dar pistas de como serão os próximos anos no MinC no quesito dos jogos digitais.
Qual dos dois teve maior orçamento para projetos culturais no MinC? Marta, mas Juca contribuiu mais para a pasta
Juca Ferreira teve mais sucesso na organização do orçamento do Ministério da Cultura comparando com a gestão Marta. Começou sua carreira como ministro da Cultura com orçamento de 0,2% do total destinado pelo governo federal, R$ 1,42 trilhão na época. Isso permitia que ele trabalhasse com aproximadamente R$ 2,84 bilhões. Parece muito? Não é. Só o orçamento da Saúde neste ano foi de R$ 80,65 bilhões, num universo total de R$ 2 trilhões.
Marta, depois de Ana de Hollanda, pegou uma época mais gorda da pasta, com R$ 3,5 bilhões para gastar em 2013. No ano passado, o orçamento caiu para R$ 3,26 bilhões, ou 0,13% de participação da verba federal. Ou seja, a minista Marta Suplicy emagreceu os esforços de Juca Ferreira. Entre erros comuns aos dois, está a falta de mobilização para que o governo libere os prometidos 1% de participação no orçamento da União, o mínimo recomendável pela ONU para investimentos no setor.
Atualmente, a PEC 150 está em tramitação e pleiteia 2% de participação para o setor, o que incrementaria investimentos substanciais para fomentar a área, dando base para uma produção cultural mais sólida.
Qual deles levou a Lei Rouanet de incentivo cultural aos jogos? Nenhum deles; foi Ana de Hollanda que fez isso
Nem Marta Suplicy e nem Juca Ferreira encaixaram os games digitais dentro da Lei Rouanet. Foi a gestão Ana de Hollanda, em 8 de dezembro de 2011, que fez isso. Essa lei abre espaço para que empresas apliquem parte de seu Imposto de Renda em iniciativas culturais.
Ao abarcar jogos eletrônicos, a Rouanet tirou o setor do alcance de ministérios como Ciência e Tecnologia. No entanto, o primeiro game a ser enquadrado dentro da lei demoraria ainda quase dois anos para ser aprovado.
Qual dos ministros aprovou o primeiro game dentro da Lei Rouanet? Foi Marta Suplicy
E ela fez isso em fevereiro de 2013 com o estúdio gaúcho Swordtales e seu jogo Toren. O enquadramento na lei permitiu que o jogo recebesse um investimento de até R$ 370 mil.
Qual dos dois fez mais declarações equivocadas sobre videogames? A Marta, claro
A ministra fez um bom trabalho com Toren, mas foi autora de declarações polêmicas. No começo de 2013, ao anunciar um recurso chamado Vale-Cultura, o Ministério da Cultura divulgou que jogos digitais não poderiam ser comprados com uma ajuda de R$ 50 para trabalhadores que ganham até cinco salários mínimos. Cobrada para se explicar, Marta Suplicy disse que “videogames não são cultura”.
A declaração repercutiu mal e desenvolvedores chegaram a fazer um game de escárnio com a ministra. O “Jogo da Martinha” ganhou ibope com o episódio.
Marta tentou se reconciliar na Campus Party em janeiro de 2014, no ano seguinte. A ministra disse que jogos digitais fazem sim parte da cultura nacional e anunciou um edital para selecionar 52 empresas e ONGs para o Primeiro Mercado das Industrias Culturais do Mercosul (Micsul). O evento teve uma ajuda de custo tímida de US$ 1500.
Qual ministro tem mais formação para entender os videogames? Juca Ferreira
Juca tem 65 anos e fez ciências sociais na Sorbonne em Paris. Ele teve uma atuação clandestina durante a Ditadura Militar fazendo um clube secreto de distribuição de livros proibidos, foi preso e exilado na época do AI-5. Seu discurso como ministro em 2008 era para fomentar a arte nacional e ele obteve sucesso na melhoria da pasta, embora não tenha dado a atenção devida aos games. Ele preparou o terreno para algumas boas atuações de suas sucessoras, e manteve atuações significativas de Gilberto Gil, como a defesa do software livre. Para a produção de games nacional, que dedica boa parte de seus programas para o sistema aberto Android, a visão de Juca Ferreira pode ser bem-vinda ao segmento, que sofreu retrocessos com a falta de tato de Ana de Hollanda com a licença Creative Commons e novas formas de compartilhamento de conteúdo. Juca também é bem quisto pelo setor de cinema, que recebeu incentivos ao longo dos dois mandatos de Lula.
Marta Suplicy atuou contra o regime militar na juventude e fez psicologia na PUC-SP, além de uma pós-graduação em Stanford. Ela despontou na mídia na TV Mulher da Rede Globo durante os anos 1980. Chocou os conservadores ao abordar temas da sexualidade na televisão aberta. Foi prefeita de São Paulo entre 2001 e 2005, responsável pela implantação bem-sucedida do Bilhete Único no transporte público, além dos Centros Educacionais Unificados em regiões carentes, os CEUs. Como gestora, ela teve reações exageradas com críticas da população sobre a reforma que promoveu no bairro rico dos Jardins. No entanto, comparando com os governos de Celso Pitta e Gilberto Kassab na capital paulistana, ela teve êxitos mais interessantes no transporte público e na educação, que ainda enfrenta problemas.
Biografia não é tudo, mas Juca Ferreira parece mais preparado para ouvir as demandas do mundo dos games, embora Marta tenha feito um bom trabalho para títulos como Toren. Se Juca fizer com que mais iniciativas se solidifiquem, pode tornar o investimento governamental mais útil dentro do setor.
Lembrete: Como cada um reage dentro da mídia
Marta Suplicy teve uma reação muito negativa sobre a escolha de Juca Ferreira para o ministério da Cultura, estremecendo inclusive as relações dela com a presidente Dilma e com o Partido dos Trabalhadores (PT). “A população brasileira não faz ideia dos desmandos que este senhor promoveu à frente da Cultura brasileira. O povo da Cultura, que tão bem o conhece, saberá dizer o que isto representa”, disse a ex-ministra.
No entanto, Ana de Hollanda também criticou Juca: “[É um] político de personalidade polêmica, extremamente belicista que, fora cargos públicos que ocupou, tem pouca relação ou conhecimento da complexa realidade do mundo da cultura”.
Mesmo com críticas pesadas das duas antecessoras, Juca Ferreira preferiu não responder e não se envolver em polêmicas no começo do segundo mandato de Dilma Rousseff.
GENIAL. Este artigo está fenomenal, cara, promovam este menino (a).
CurtirCurtir
Pingback: 20 novidades que mexeram com a cena brasileira de games – 11/01/2015 | Geração Gamer
Pingback: “Quero mostrar que videogames são uma economia possível para o Brasil”, diz novo ministro Juca Ferreira | Geração Gamer
Pingback: Os 10 posts mais lidos de 2015 | Geração Gamer